Segundo dia Continuamos o diário de bordo da expedição que avança rumo ao Oceano Pacífico através da Transoceânia, a rodovia que corta os Andes através do Peru, e hoje vamos contar como foi nosso segundo dia na estrada.
Comitiva na fronteira
Levantamos cedo para tomar o café no hotel de Epitaciolândia, no Acre, completamente tomado pelos integrantes da comitiva e sem estrutura suficiente para nos atender. O mais complicado era subir e descer os quatro andares de escadas entre o quarto (sem telefone) e a recepção, onde ficava o restaurante (e as toalhas, que são entregues somente se o hóspede solicitar).
Abastecidos, vamos para a estrada para mais 130 quilômetros até Assis Brasil, na divisa com o Peru, ainda conduzidos pelos batedores da Polícia Rodoviária Federal. Estrada estreita e sem acostamento, mas em boas condições, sem buracos, chegamos no posto da Polícia Federal por volta de 8:30 horas, e ai começou o martírio: primeiro para carimbar os passaportes e depois para declarar os equipamentos eletrônicos na Receita, cujo fiscal só chegou uma hora depois. Desembaraçados, entramos no Peru às 10:10, indo direto para o posto da Aduana, onde sequer tinha papel para quem precisasse tirar uma cópia do passaporte. Dessa escapamos, tínhamos uma resma de papel no porta malas!
Passaporte carimbado, fomos negociar com as cambistas para comprar sólis, a moeda local. Um dólar vale 2,95 sólis, e, com um real, se compra 1,32 sólis. Na fronteira tem barzinhos de beira de estrada, que eles aqui chamam de bodegas, e là encontramos suco de laranja Tampico, sucos de frutas variados e refrigerantes. Uma caixa de um litro de suco de pêssego custou 3 sólis, uma Coca latinha por 2 sólis. Tudo importado do Brasil!
E foi na Aduana que um quase incidente diplomático aconteceu: a vigilância sanitária do Peru vistoriou todas as camionetes e não permitiu a entrada no país de um isopor que continha 50 quilos de saborosa picanha rondoniense, que o governador iria oferecer num churrasco com os governadores que encontrasse no caminho. Os fiscais alegaram que a carne deveria estar acondicionada em carro frigorífico lacrado, de acordo com as normas de sanidade local, e de nada adiantaram nossos argumentos com o cônsul: a picanha foi apreendida, perdemos duas horas parados e não almoçamos. O jeito foi seguir viagem para Puerto Maldonado à base de bolachinhas e água mineral, pois até as frutas foram apreendidas.
Cunetas Profundas
Do posto da fronteira até Puerto Maldonado são mais 230 quilômetros de ótima estrada, sem buracos, com alguns vilarejos e nenhuma estrutura. Não encontramos nenhum posto de combustível que parecesse confiável, e nem banheiros. Quando a coisa apertou, o Dr. Amado, médico da Comitiva, pediu para dar uma paradinha na beira da estrada mesmo para um J-8 (?). Paramos todos no acostamento numa grande reta e às margens da rodovia nos aliviamos, e também descobrimos que J-8 é o código usado pelos militares para designar BANHEIRO!
Aproveitamos a parada para um lanchinho, alguns com biscoitos e outros com farofa e frango frito, sob um sol de lascar, pois não tinha nenhuma árvore. A paisagem lembra o trecho entre Nova Mamoré e Guajará-Mirim, mas com o asfalto impecável, pontes modernas com guard-rail e nenhum carro passando.
Mas o que chamou atenção foram seguidas placas de “Cunetas Profundas” a cada trezentos metros na estrada. Descobrimos que cunetas são valas cavadas ao lado da estrada para escoar a água da chuva, e que no caso peruano são muito fundas, com mais de um metro. Muito cuidado no trecho, pois se cair ali não tem volta, o acidente pode ser muito sério.
Faltando 30 quilômetros para chegarmos acaba a estrada de asfalto e, a partir dali, a Odebrecht está fazendo a terraplanagem e compactação. Seguimos lentamente devido à poeira e os fiscais que fecham uma das mãos da pista para a passagem dos caminhões e tratores.
À beira do rio Madre de Dios acaba a estrada, uma grande ponte está sendo construída e só deve estar pronta em dois anos. Cruzamos o rio de balsa, 12 de cada vez, e chegamos a Puerto Maldonado, do outro lado, em 10 minutos. Aguardamos os demais, nos agrupamos novamente e seguimos em grupos aos três hotéis que nos reservaram, pois nenhum deles tinham estrutura para receber todos nós juntos. Mesmo com as reservas antcipadas foi um sufoco acomodar todo mundo ao mesmo tempo, muita reclamação com os atendentes, que não trabalham no nosso ritmo, portanto, não se estresse. O governador e parte da comitiva foram para o Hotel Cabaña Quinta, excelente para os padrões locais, alguns seguiram para o Don Carlos, um pouco afastado, sem internet e em reformas, mas com uma piscina que foi devidamente aproveitada por nós, o José Otononio, vice-prefeito de Ji-Paraná foi um dos que mais comemorou a chegada.
E justamente na chegada mais um susto: o Lairton, nosso motorista, estava sentindo dores abdominais desde a saída de Assis Brasil, e no final da tarde decidimos levá-lo ao hospital para um exame. Aqui vale um registro sobre o sistema de saúde local: o hospital daqui é igual a todos os outros, mas não tem pacientes pelos corredores e o médico atende na hora, passa a receita e você compra os medicamentos ali mesmo, numa farmácia bem equipada e tudo muito barato para os nossos padrões de preço.
O Lairton foi para o soro e colher sangue e nós fomos almoçar (eram 17:30 horas) e nos prepararmos para uma solenidade de aniversário de 60 anos e posse da nova diretoria da Associação Comercial de Puerto Maldonado, no Clube Taócas, uma boate com decoração bem dark, tudo preto e decorada com estátuas esquisitas imitando demônios voadores e a presença de todas as autoridades locais, nossa comitiva e empresários maldonaldenses.
Ao falar ao grande público presente o governador Ivo Cassol falou do potencial econômico do Estado e a oportunidade que nossos empresários estavam oferecendo, com produtos de qualidade a preços competitivos. “Somos quase vizinhos, mas estamos de costas um para o outro. Tudo que o Peru precisa nós temos, e a preços muito competitivos, por isso estamos aqui”, aproveitando para convidar os empresários a conhecerem nosso Estado.
No final, danças típicas e um jantar oferecido pelo alcaide, o prefeito local: num pratinho de entrada duas fatias de batata cobertas por um molho muito apimentado e umas rodelas de pepino e tomate, Não deu para encarar, mas os locais apreciam muito. E como prato principal um prato maior, de plástico, com um espetinho de frango, um de carne, uma salsicha e salada de batata com ervilhas e milho. Tudo frio! Também não deu para engolir…
A comitiva foi para os hotéis e nós voltamos para o hospital para saber do resultado dos exames do Lairton e não deu outra: apendicite. Os médicos que nos acompanham, Dr. Amado e Dr. Rached, conversaram com o cirurgião do hospital e com o Lairton, e todos chegaram ao mesmo veredito: operar imediatamente, antes que ficasse pior, mesmo ele estando bem, sem dores e conversando, e assim foi feito, para que retorne à Porto Velho no final de semana sem riscos. Às 3:00 horas da madrugada nosso motorista saiu do centro cirúrgico e nós fomos para o hotel descansar, pois hoje, quinta, começam as rodadas de negócios e os encontros políticos, e precisavamos estar com as baterias carregadas. Até lá!
Fonte: DECOM – Departamento de Comunicação Social