A discussão da obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista mobilizou estudantes e profissionais de comunicação ontem à noite em torno da palestra “Ter ou não ter, eis a questão: o diploma de jornalismo em debate”, promovida por alunos do sexto, sétimo e oitavo semestres de jornalismo do Centro Universitário de Brasília-UniCEUB, com apoio da Coordenação do curso.
O Diretor-Geral, Fernando Tolentino, integrou a mesa-redonda ao lado do coordenador do curso de Comunicação, professor Henrique Moreira; da representante dos alunos, Maria Melo; do deputado federal por São Paulo, Celso Russomano; do diretor da Federação Nacional dos Jornalistas-Fenaj, José Carlos Torves; do presidente do Sindicato dos Jornalistas do DF, Romário Schetino, dos jornalistas Eliane Catanhêde (Folha de S. Paulo), Leandro Fortes (Carta Capital), Diego Iraheta (Rádio Band News FM) e do diretor da rádio comunitária Utopia, de Planaltina, João Batista Oliveira.
A maioria dos debatedores mostrou-se favorável à obrigatoriedade do diploma, posição seguida por Tolentino, que apresentou-se como “jornalista de formação, com muito orgulho”, Ele combateu o “argumento falacioso” dos contrários ao diploma, pelo qual a regulamentação profissional da classe jornalística teria surgido no regime militar e por isso fere a liberdade de expressão. “Jornalista não é um profissional da liberdade de expressão. A junta militar de 1969 que regulamentou a nossa profissão também instituiu a de fisioterapeuta, administrador, economista e tantas outras”.
Para Tolentino, as questões fundamentais da profissão estão sacramentadas, como a existência de um conteúdo próprio, corporação, reconhecimento pela sociedade, ética e técnica. “O fim do diploma trará um mau jornalismo, exercido por pessoas frustradas em determinadas profissões”. Transmitiu os resultados de uma pesquisa recente da Fenaj — para “saber se a sociedade havia se contaminado com a suspensão do diploma” — que mostrou a ampla aceitação do título entre os entrevistados. “Nossa sociedade está determinada a exigir diplomas para as profissões. Não há nada que defina o diploma de jornalista como menos importante que o de médico”, finalizou.
Como representante dos estudantes, Maria Melo expressou sua expectativa em debater o papel dos comunicadores no dia de hoje, direito do cidadão à informação de qualidade e a necessidade de fiscalização. Eliane Catanhêde esclareceu que falaria em seu nome e não como representante da Folha de S. Paulo, veículo no qual trabalha e que combate a exigência do diploma. “Tenho tendência a favor do diploma, mas defendo também a necessidade do debate”. Eliane avaliou que os não jornalistas deveriam atuar em áreas técnicas e alertou para a mudança dos currículos dos cursos de comunicação e para a falta de contato da academia com a realidade brasileira.
Diego Iraheta elogiou a faceta generalista da profissão, alcançada pelo estudo de diferentes disciplinas na faculdade, promotora da criação e do discurso atraente, desde que o estudante seja interessado e comprometido.
Leandro Fortes afirmou que o jornalismo é a única profissão do mundo que abriga profissionais defensores da extinção do próprio diploma. Projetou uma apresentação em que destacou itens da evolução do trabalho jornalístico, como a passagem do nariz-de-cera ao lide, das pocilgas às redações assépticas, do personalismo ao assédio moral. Segundo Leandro, não há demandas externas para suspender o diploma e o discurso patronal apóia-se em um desrespeito tolerado, no desprezo pela formação acadêmica e no saudosismo. Os desafios, conforme ele, são a multimídia, o incentivo ao magistério, o novo papel dos sindicatos, o resgate ético e a separação formal entre assessorias de imprensa e jornalismo.
Romário Schetino defendeu a manutenção do diploma como um direito conquistado por jornalistas e professores. “Não nos furtamos às necessárias críticas. Defendo que o Ministério da Educação interrompa a concessão de autorizações para novos cursos de comunicação até que se faça um pente-fino na rede de ensino, mas que também se discuta a concentração da propriedade dos meios de comunicação”, afirmou. Informou que a Fenaj brigou pelo Conselho Federal de Jornalismo, “mas foi bombardeada pelos mesmos que exigem o fim do diploma hoje”.
João Batista de Oliveira posicionou-se contra o diploma e relatou as lutas da rádio Utopia desde 1998 para que a grande mídia de Brasília divulgasse o autoritarismo da então secretária de Governo, Maria do Barro, e outras reivindicações da comunidade de Planaltina. Expôs exemplares do jornal Eco, produzido por não jornalistas, “mas que não fica a dever para jornais como a Folha de São Paulo”. Contestou os vários pontos citados anteriormente em favor do diploma e disse que não era “contra a exigência, mas sim contra a obrigatoriedade”.
José Torves comunicou que sempre debatera com pessoas contrárias ao diploma, porém não poderia deixar de rebater “a agressão” dos argumentos de João Batista, resultado do “desconhecimento da história”. Relembrou a presença de censores da ditadura militar nas redações, os jornalistas mortos, os exilados. “Não podemos aceitar a acusação de que jornalistas foram serviçais da ditadura”. De acordo com Torves, a luta pela regulamentação vem desde a década de 1940 e a necessidade do diploma já fora defendida há cem anos pelo então presidente da ABI, Gustavo Lacerda, que cursou apenas o 1º grau, mas sentia a necessidade de formação. Afirmou que a Fenaj apóia as rádios comunitárias, entretanto a “legitimidade só virá quando forem regulamentadas, cumprirem seu papel e se livrarem da tutela de grupos políticos e religiosos”. Como por decisão judicial desde 2001 não há exigência do diploma, Torves indagou o que mudou na liberdade de expressão desde então. “Nada. A legislação de rádio e televisão está parada há 50 anos. É uma falácia”!, arrematou.
Como parlamentar, Celso Russomano disse que discute o assunto desde 1994. Autor do Projeto de Lei em tramitação que institui o Conselho Federal de Jornalismo, lembrou que em 1995 propôs o primeiro projeto de um Conselho Federal e outro Regional para a classe, “porém a Fenaj e os sindicatos foram contra. Médicos e farmacêuticos têm conselho de classe. Jornalista não. Sem conselho não existe fiscalização”. Ele dividiu a história do jornalismo entre o tempo romântico e o tempo do banco da faculdade. “O mercado está preparado a receber os profissionais vindos das faculdades, mas o direito adquirido pelo não jornalistas deve ser respeitado”, sintetizou.